Espaço Associado

Em Portugal, os mercados de Serviços de Sistema são atualmente um dos principais temas de discussão. Não porque sejam uma novidade, mas porque, recentemente, as tecnologias renováveis não despacháveis* começaram a ingressar nesses mercados, transformando um recurso intermitente em um mecanismo de flexibilidade para o sistema elétrico.
*É importante ressaltar que, ao falarmos de renováveis neste contexto, estamos nos referindo especificamente à energia solar fotovoltaica e à eólica, pois a energia hidráulica, por ser controlável, há muito tempo participa desses serviços.
Nos últimos anos, em Espanha, as renováveis passaram a ocupar uma participação significativa nesses mercados. Entre maio e setembro de 2024, a potência média atribuída à energia solar fotovoltaica na reserva de regulação secundária variou entre 21% e 24%; em maio, 60% da potência média atribuída ao serviço foi destinada a tecnologias renováveis e, da da energia mFRR ativada a descer ao longo do mês, 78% foi de origem renovável. Na Espanha, as renováveis já são um recurso ativo relevante nesses serviços, e as receitas adicionais obtidas nos mercados auxiliares já são consideradas nos modelos de financiamento das renováveis e na estruturação de PPAs.
Em Portugal, por outro lado, a entrada das renováveis não despacháveis nos Serviços de Sistema é um fenômeno mais recente. Em dezembro de 2023, o operador do sistema português (REN) organizou o primeiro workshop sobre “Participação das Fontes de Energia Renovável no Mercado de Serviços de Sistema”, com o objetivo de informar os produtores sobre as oportunidades existentes nesses mercados auxiliares e os benefícios que poderiam ser obtidos.
Apesar da iniciativa da REN, na prática, ainda não era totalmente viável (ou pelo menos fácil) que esses ativos renováveis participassem dos serviços de sistema. No entanto, desde então, houve muitas mudanças normativas e novas propostas por parte da ERSE (entidade reguladora) e da própria REN, adaptando tanto os mercados quanto os requisitos do sistema às particularidades das renováveis, permitindo sua participação nesses serviços.
Não há dúvidas de que a transição energética supõe um novo paradigma em todos os aspectos. A integração massiva das renováveis nos sistemas energéticos representa um grande desafio para manter seu equilíbrio, além de criar novos cenários de mercado que geram incerteza, como os preços zero ou negativos. Quando, em 2024, os preços negativos apareceram pela primeira vez no mercado diário do MIBEL, surgiram questionamentos sobre a viabilidade econômica de uma tecnologia cuja tendência era reduzir os preços, afetando diretamente a rentabilidade dos produtores.
Contudo, a intermitência dos recursos renováveis aumenta a necessidade de Serviços de Sistema pelo operador, ou seja, quanto mais renováveis, mais ativação de energias de balanço. Hoje, falamos menos sobre a porcentagem de geração renovável e mais sobre a porcentagem de curtailment dessas tecnologias, pois o problema não é mais a falta de renováveis no mix energético, mas sim a capacidade dessas fontes de gerar energia de forma distribuída, sem congestionar nós de rede ou gerar grandes desequilíbrios no sistema. Para isso, os serviços de ajuste são essenciais. Assim, diante de preços baixos no mercado diário ou intradiário, observa-se valores muito mais atrativos nos mercados de Serviços de Sistema. Essa correlação inversa abre novas possibilidades para os produtores dentro desse novo paradigma de mercado.
Até recentemente, o operador português mantinha o equilíbrio do sistema através de grandes centrais gestionáveis e comunicações diretas. Agora, o desafio é que a regulação também seja realizada por meio de Centros de Controle delegados, agregando diversas instalações de diferentes tecnologias e tamanhos, de forma distribuída.
Em fevereiro de 2025, a REN organizou o segundo workshop sobre “Mercados de Serviços de Sistema e os desafios da integração da produção renovável”. Nesta altura, as renováveis já estão participando dos mercados de Serviços de Sistema em Portugal e, embora ainda haja muito a ser feito, essa possibilidade já está ao alcance de qualquer produtor. Agora, o desafio para aqueles que já participamos ativamente desses serviços é ajudar outros produtores a entender como podem ingressar nesses mercados e quais são as vantagens de fazê-lo, sendo esse o principal objetivo deste segundo encontro.
Devido à figura do Agregador, pequenos e médios produtores agora também podem considerar a participação nesses mercados por meio de um Centro de Controle delegado, evitando assim investimentos elevados em sistemas e telecomunicações necessários para a participação direta nesses serviços. É importante lembrar que, além de serem mercados economicamente atrativos, os Serviços de Sistema exigem resposta em tempo real, comunicações diretas com o operador do sistema e uma alta capacidade de reação diante de qualquer perturbação. Um Centro de Controle delegado pode garantir essa operação para qualquer produtor dentro do seu portfólio, tornando essas oportunidades acessíveis a todos.
Em resumo, não há dúvidas de que as renováveis são indispensáveis para a transição energética, mas sua integração também apresenta novos desafios para os mercados e sistemas energéticos. O verdadeiro valor agora reside em transformar as renováveis em um ativo flexível, capaz de contribuir para o equilíbrio do sistema e gerar receita em todos os mercados disponíveis.